sábado, janeiro 31, 2009

Leis que fazem falta!

O senhor presidente da República insurge-se contra o legislador e acusa-o de estar na génese de problemas económicos e sociais. Sobretudo por causa da Lei do divórcio...


O legislador tem humores, estados de espírito e manhas que vão variando ao longo dos tempos.
Não confio muito neste tipo, reconheço-o. Recordo o tempo em que ele (legislador) argumentava que era preciso fazer concurso público para empreitadas acima de 20.000 contos. E porquê?
Segundo ele (legislador) a partir desse montante poderiam caír em tentação os decisores politicos e, aliados aos empreendedores, em cambalacho promíscuo, fazer falcatruas lesivas do interesse público. Até 20.000 contos o concurso limitado, simples e expedito, era legítimo, a partir daí já não.
Que legislador desconfiado! que legislador mesquinho! então permitia-se desconfiar da honorobilidade de autarcas e de empreiteiros, pessoas seriíssimas e incapazes de se associarem para fins tão pouco recomendáveis como é a lesão patrimonial do erário público!!!

Baseado nisso, eu, membro de assembleia municipal, pedi um inquérito por julgar que não sendo feitos concursos públicos para empreitadas de 50.000 ou de 100.000 contos poder-se-ia estar a caír na tal tentação. Nessa data, todas, mas todas as empreitadas acima de 20.00 contos eram feitas por concurso limitado nessa autarquia. Eu confiei na bondade do legislador. Pedi um inquérito à alta autoridade contra a corrupção. Admiti que pudesse haver crimes de lesa-economia a fazer fé na presunção do próprio legislador! Ingenuidade a minha!

O alto comissário era obrigado a garantir sigilo. Dizia o legislador (outra vez esse picuinhas...), que o sigilo era necessário para evitar vinganças, retaliações, abusos, por parte dos visados nessas queixas. Mas o ACCC esteve-se nas tintas para o sigilo. Antes de investigar fosse o que fosse, permitiu que a carta fosse divulgada e chegasse às mãos dos visados.Por telefone disse-me que não fora ele. Mas sim alguém do governo que pedira o documento garantindo sigilo e não cumprindo essa promessa... Enfim, se eu quisesse processar o violador, teria que processar todo o conselho de ministros, tendo à cabeça o presidente, o impoluto dr Mário Soares, o próprio progenitor da tal Lei geradora do cargo de Alto Comissário Contra a Corrupção!!!!! Era obra!!!

A retaliação surgiu de imediato. Um processo judicial. Os factos eram verdadeiros. Uma empreitada (talvez a maior) adjudicada por cerca de 48.000 contos (com custos finais a rondar os 120.000...) fora executada sem concurso público, apenas concurso limitado.

Segundo a Inspecção que se seguiu (muito mais tarde) todas as empreitadas que deveriam ter concurso público não eram alvo desse tratamento, mas apenas de concurso limitado, mais prático, mais expedito. Mas também mais susceptível de encarecer a obra, como aliás se viu...

Ora acontece que o meritíssimo juiz, em tribunal, considerou que o termo «crime de lesa-economia» era um insulto grave à honra e bom nome do presidente da câmara. Se esse processo não era mais que uma retaliação, uma vingança, um salto em frente para limpar a imagem, isso não cuidou de saber. O juiz esteve-se marimbando para o legislador, essa figura sempre desprezível.

A propósito deste presidente da República, devo confessar que tenho memória de elefante. Recordo ainda o tempo em que ele verberava as entidades de supervisão (as tais que ele afirma terem falhado agora, no dealbar desta crise...) chamando-lhes nomes feios: «forças de bloqueio» e coisas similares... Era o Tribunal de Contas, o Provedor de Justiça, sobretudo estes garantes da legalidade e dos direitos dos cidadãos. Todos em xeque. Tudo posto em causa!

Senhor presidente, lamento dizer-lhe mas o senhor não tem moral para falar. Permitiu que no segundo mandato o país fosse conduzido de forma desbragada, laxista, saciando a voracidade de clientelismos pouco abonatórios. Depois foi o que se viu. Uma não equitativa e irracional distribuição de benefícios alimentou uma caterva de novos-ricos que poderão estar na géneses da existência de novos -pobres na hora que passa. Esse dinheiro que foi alimentar contas no estrangeiro, essas pipas de massa que alguns subtraíram e foram engordar pecúlios talvez nalgum off-shore, estão agora a fazer falta ao país.
Vemos por aí muitos sinais exteriores desse exibicionismo...

É preciso criar leis que previnam a corrupção. Leis que impeçam os enriquecimentos ilícitos. Leis que obriguem os políticos à transparência, ao respeito pelos órgãos fiscalizadores. Ser membro de uma assembleia municipal, estando em minoria, é meio caminho para ser insultado, vilipendiado, se se quiser ser escrupuloso no cumprimento do dever. O país está cheio disso tudo. Veja a Madeira onde a situação atinge picos de intolerância e de patologia social. Que disse o senhor quando lá esteve? Remeteu-se ao silêncio. Fez ouvidos de mercador.
E eram graves os vitupérios. E foi posta em causa a sua autoridade. Foi colocado em xeque o prestígio da ARM e o do próprio PR!

Agora vem este governo propor a obrigatoriedade de concurso público (nalguns casos) para verbas acima de 5.000.000 de euros(cinco milhões!); até lá não irão os decisores políticos nem os empreiteiros caír em tentação!!! ficará na lei! a lei será a porta aberta para a promiscuidade mais vil! Ou será que o legislador ensandeceu de vez?!

3 comentários:

dimasmaio disse...

AÍ, ousado rouxinol !
Não se limita a cantar bem. Também se atreve a dar umas boas bicadas.
Mas...e os gaviões, não os teme ?
Depois não diga que não o avisei.

Realmente, um passarinho, embora bom cantador a desafiar uma RAPACE !!!

Marieke disse...

Olá amigo Rouxinol
Nada melhor numa noite de invernia como esta do que ler e principalmente ver o que se passa neste teu fantástico blogue
Um abraço
Marieke

Manuel CD Figueiredo disse...

No que respeita ao limite dos 5 milhões de euros, já vimos que o Governo recuou, tão evidente seria a falta de seriedade. Mesmo assim, estamos cá para ver as falcatruas que não se farão...ao abrigo da lei! Pois se é este o princípio (da falta de seriedade) que vem sendo usado...
Quanto à qualidade das leis, pensa o PR que somos moucos e não ouvimos o que diz, ou que somos tolos e acreditámos que a pureza de princípios nasceu agora!